O último capítulo da Exortação Apostólica pós-sinodal Amoris
Laetitia, do Papa Francisco, que completa 5 anos de publicação, nos coloca
diante da proposta de uma bela e profunda espiritualidade conjugal e familiar.
O amor da vida de família tem dimensões próprias, que revelam o amor de Deus
para com todos os seus filhos e filhas.
Acima de tudo, “a Trindade está presente no templo da
comunhão matrimonial” (AL 314). Deus habita a vida de cada família, se faz
presença em cada lar, sente junto com cada um de seus membros as aflições,
consolos, dúvidas, sofrimentos, angústias, alegrias, esperanças – situações
concretas do cotidiano da vida. E nesse horizonte é que se pode compreender que
“a espiritualidade matrimonial é uma espiritualidade do vínculo habitado pelo
amor divino” (AL 315), que se manifesta na realidade do amor familiar.
Cristo deve ser sempre o centro da vida da família. É o seu
amor redentor que a unifica na fé, na caridade, na verdade. Desse modo, “os
momentos de alegria, o descanso ou a festa, e mesmo a sexualidade são sentidos
como uma participação na vida plena de sua Ressureição” (AL 317). Esta fé se
reforça na valiosa prática da oração em família, redescoberta como necessidade
nesses duros tempos de coronavírus que enfrentamos. Na celebração dominical da
eucaristia, de modo particular, é que se reforça e reafirma a espiritualidade
da pequena “Igreja doméstica” que é cada família.
Na fidelidade da mútua pertença dos cônjuges, coração do
pacto conjugal e verdadeiro estilo de vida matrimonial, se manifesta aquela
mais central e interior pertença ao Senhor. Na unidade indivisível do coração,
o amor encontra verdadeiro espaço para desenvolver as capacidades humanas em
sua plenitude: confiança, liberdade, autonomia, caridade. E ainda mais: “O
espaço exclusivo, que cada um dos cônjuges reserva para a sua relação pessoal
com Deus, não só permite curar as feridas da convivência, mas possibilita
também encontrar no amor de Deus o sentido da própria existência” (AL 320).
Pelo dom da fecundidade, o casal participa da obra da Criação
do próprio Deus! Na capacidade gerar e cuidar, pai e mãe se transformam em
“sacramento”, sinal e reflexo, do amor do Senhor para com seus filhos. “Por
isso, ‘querer formar uma família é ter a coragem de fazer parte do sonho de
Deus, a coragem de sonhar com Ele, a coragem de construir com Ele, a coragem de
unir-se a Ele nesta história de construir um mundo onde ninguém se sinta só’”
(AL 321). No cuidado responsável de uns com os outros se manifesta a caridade e
misericórdia do próprio Senhor, que ama cada pessoa individual e confere a ela uma
dignidade especial de filho e filha, à sua imagem e semelhança.
Saindo dos limites de seu núcleo mais estrito, a família é
chamada a viver a hospitalidade com dom e compromisso, como verdadeira missão
que acolhe toda vida humana e se esforça em fazer o bem indistintamente, como
Jesus. Esse deve ser um aspecto forte de sua espiritualidade, de sua intimidade
e participação na vida divina. É dessa forma que “a família vive sua
espiritualidade própria, sendo ao mesmo tempo uma igreja doméstica e uma célula
viva para transformar o mundo” (AL 324).
Claro que “nenhuma família é uma realidade perfeita e
confeccionada de uma vez para sempre, mas requer um progressivo amadurecimento
da sua capacidade de amar” (AL 325). E aqui está o desafio e a graça da vida e
da vocação da família: ser capaz de crescer no amor, com alegria! Se as
realidades do mundo contemporâneo nos desafiam, nos anima a esperança e a graça
divina, que nos chamam a ir além de nós mesmos e, contemplando o mundo com os
próprios olhos de Deus, sob a luz do Evangelho, transformá-lo em verdadeira
família onde todos, como irmãos e irmãs, possam se sentar à mesa do Pai
misericordioso e repousar junto ao seu coração amoroso e bondoso.
***
Este texto conclui uma série de
doze pequenos artigos sobre a Exortação Amoris Laetitia. Se você quiser
se aventurar a ler os anteriores, segue os links em ordem de publicação:
http://www.pluriversoteologico.com.br/2016/08/a-alegria-do-amor-amoris-laetitia-i.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2016/08/o-evangelho-da-familia-amoris-laetitia.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2016/09/a-realidade-e-os-desafios-das-familias.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2016/10/um-desafio-particular-o-enfraquecimento.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2020/08/a-vocacao-da-familia-amoris-laetitia-v_59.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2020/08/o-amor-no-matrimonio-amoris-laetitia-vi_27.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2020/09/o-amor-que-se-torna-fecundo-amoris.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2020/11/algumas-perspectivas-pastorais-amoris.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2021/04/entre-crises-e-angustias-amoris.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2021/04/reforcar-educacao-dos-filhos-amoris.html
http://www.pluriversoteologico.com.br/2021/06/acompanhar-discernir-e-integrar.html
Obrigado pela maravilhosa reflexão. Um texto repleto de dicas cristãs para uma vida mais próximo de Deus e Seu Reino. Obrigado por mais esse belíssimo texto. Parabéns
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