Em dias nublados não me animo a ler. Gosto mais de me dedicar
a pensar. E estou aprendendo também a escrever.
Dias nublados fazem parte do vai-e-vem meteorológico do
mundo. Por mais que haja previsões, não é possível contê-los nem os deter. Eles
simplesmente existem, chegam com alguma preparação ou não, e modificam o
ambiente, e, quase sempre, também os nossos humores.
É curioso como o clima externo influi nessa percepção interna
de nós mesmos. Sentimentos e pensamentos se ativam, e nos levam, tantas vezes
despretensiosamente. E nos mudam. E nos fazem. A vida interior também seus dias
nublados. Ninguém é feito só de luz, nem só de sombras.
E por vida interior me refiro a toda atividade do nosso
pensamento e sentimento: afetividade, emoção, razão, espiritualidade, sonho,
esperança... tudo que nos faz ser como somos, que nos configura como pessoa
humana única, irrepetível, singular. Interioridade. Que não se trata de uma exclusão
ao corporal, material, externo a nós – porque também isso nos faz ser como
somos, nos configura em nossa individualidade e personalidade. Interioridade e
exterioridade são as duas faces da mesma moeda que somos nós, intrinsecamente.
Nuvens internas sinalizam necessidades que carecem
satisfação. Geralmente nos tomam em forma de angústia, e nos colocam diante do
sentido da vida, da nossa existência histórica única, do que nos configura
enquanto indivíduos. São como um espelho, em que nos refletimos no mais íntimo
de nossos sonhos e desejos. Na ânsia de uma vida mais plena e feliz. Quem nunca
passou por isso?
Bom seria que as nuvens sempre trouxessem boa chuva. Águas
que caem do céu irrigam o solo seco de nossas dúvidas e medos. Fazem brotar
esperança. Dão alento em meio à aridez dos sonhos não realizados, das metas não
cumpridas, da vida que se queria ter e não se pôde fazer. Chuva é sempre sinal
de abundância. Enxurradas que correm livres aquecem o coração.
Mas nem sempre é assim.
Quando existem fortes barreiras, qualquer chuva vira enchente,
e causa prejuízos. Inundações desproporcionais nos levam ao caos e à exaustão.
É difícil remar contra a corrente, ainda mais quando não se tem técnica
suficiente. O desespero faz sucumbir a criatividade. É quando, afogados, nos
perdemos.
Outra vezes, as nuvens insistem em permanecer com sua sombra
estranha e desconcertante, imóveis, pesadas, angustiantes. Nos desinstalam na
incerteza e na inércia de não saber o que fazer de nós mesmos. Nos roubam a
confiança. Revelam nossa fragilidade. Nos traímos.
Mas não precisa ser assim.
Em todo caso, é preciso tomar uma atitude. Você pode ficar em
casa chorando de medo ou fazer um café quentinho. Você pode sair com a frágil
segurança de um guarda-chuva na bolsa ou mesmo arriscar não se precaver. Você
pode se refugiar sob o edredom ou sair pro quintal e tomar banho na torrente ou
na água que cai da bica da calha. Você pode se esconder ou se encontrar.
Em todo caso, é você quem internaliza a nuvem e a chuva. Em
si mesmas, elas não são nem boas nem más. O que importa é o que você faz com
elas – e delas. Agora é com você.
Muito obrigado pela partilha e belo texto. Perfeito
ResponderExcluirA busca incessante de se encontrar consigo mesmo....muito interessante !!!
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