Pular para o conteúdo principal

“O Senhor é nossa justiça” (Jr 33,16)


Uma homilia sempre aberta, para o I Domingo do Advento do Ano C.

A liturgia desta última semana do Tempo Comum nos prepara diretamente para a liturgia que abre o novo Tempo do Advento: os sinais um tanto catastróficos que nos tem sido apresentados pelos textos sagrados são um sinal de alerta – algo novo, “terrível e grande” (Sl 99,3) se aproxima.

No ano litúrgico C que abriremos no próximo domingo, I do Advento, a palavra de ordem da primeira leitura parece ser “justiça”. O cumprimento da promessa é a justiça de Deus que se estabelecerá sobre a terra. Jerusalém, cujo nome se relaciona a “paz” (“shalom”), encontrará a plenitude dessa paz na justiça (o novo nome) que se manifestará em todos aqueles quantos creem no Deus da vida.

São Paulo, na segunda leitura, aponta onde deve necessariamente repercutir essa nova justiça divina: na vida fraterna, vivida no amor mútuo entre os irmãos, que gera verdadeira santidade. Nos laços cada vez mais fortes de santidade, na caridade fraterna, se pode experimentar mais intensamente e, assim, “apressar” e antegozar o Céu, a vinda do Senhor.

Na pista do texto do evangelho, a oração, o contato de intimidade com o próprio Deus é que tornará possível ao fiel “ficar de pé” no Grande Dia. É no contato amoroso com o Senhor, experienciando sua misericórdia nas vicissitudes de cada dia, buscando ouvir atentamente a sua voz nos acontecimentos mais corriqueiros, que alcançaremos a força para dar o bom testemunho de nossa fé. Não podemos nos tornar insensíveis!

A Igreja ensina a celebrar o Advento como um tempo de alegre expectativa, porém na sobriedade que a liturgia nos exige. É tempo propício para uma profunda revisão de vida com vistas a uma sincera conversão que vai, pouco a pouco, nos libertando totalmente para uma vivência mais intensa da graça. Ao invés de apenas contemplarmos a Senhora grávida, neste Advento deixemo-nos encher de Deus, para que sejamos capazes de trazê-lo à luz em meio a tantas trevas que nos ameaçam a fé, que nos tentam roubar a esperança, que nos torna omissos e fracos diante das exigências do Evangelho. Que o rosto de Jesus transpareça em nosso rosto! Que sua mão misericordiosa se estenda por meio da nossa! Que sua justiça se faça em nossa fraqueza, para que cresçamos no amor!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Lavar os pés. De quem? Para quê?

  Pensando na liturgia da Quinta-feira Santa, que já está bem próxima, é impossível não vir à mente a imagem de Jesus lavando os pés dos seus discípulos. Cena forte, impactante, envolvente. Tanto é que muita gente chama a celebração desse dia solene simplesmente de “missa do lava-pés”. Quem nunca se imaginou tendo os pés lavados pelo padre nesse dia? Muita gente chora quando é convidado ou até mesmo pego de improviso para esse gesto. Você também? Porém, o que existe de mais nesse gesto? Lavar os pés era a tarefa dos escravos. Era um sinal de submissão à autoridade de outrem. Jesus que se abaixa e lava os pés dos Doze sinaliza sacramentalmente sua vocação de servo da humanidade, em obediência à vontade do Pai e coerência à sua própria palavra: “Quem quiser ser o maior, se faça o servo de todos” (cf. Mc 10,44). Oferecer água para lavar os pés era significativo gesto de acolhida israelita. No calor escaldante do deserto, ao ser recepcionado a uma casa para uma refeição, especialmen

Micropoema de Semana Santa

  Era noite No coração de Judas Feliz de quem não se encontra sozinho na hora mais sombria Nem sempre há um anjo do céu para nos confortar   --- (Referências a Jo 13,30 e Lc 22,43)

Entre crises e angústias – Amoris Laetitia IX

Continuamos no capítulo VI da Exortação Apostólica Amoris Laetitia, do Papa Francisco, que trata de lançar luzes sobre algumas perspectivas pastorais no complexo universo da família neste início de milênio. Antes de tudo, é preciso ter a consciência de que o amor é chamado a amadurecer com a experiência da vida. Nesse processo, não existe imunidade a crises, angústias e sofrimentos. É entre dores e obstáculos que a alegria do amor se revela, especialmente quando se trata da vida conjugal e familiar. Na verdade, “cada crise esconde uma boa notícia, que é preciso saber escutar, afinando os ouvidos do coração” (AL 232). Crises são oportunidades de reaprender o valor do perdão e do sonho. “Cada crise é como um novo ‘sim’ que torna possível o amor amadurecer reforçado, transfigurado, amadurecido, iluminado” (AL 238). É preciso, para tanto, uma atitude de abertura constante e acolhida solidária, para discernir caminhos de libertação e cura de feridas graves e imaturidades. Uma das mais