Com a
celebração da quarta-feira de cinzas
abre-se o tempo litúrgico da Quaresma,
tempo dedicado, de modo pessoal e comunitário, à conversão, especialmente através
das práticas de penitência e dos
consagrados exercícios de jejum, esmola e oração.
Os 40 dias
desse tempo são como um grande retiro espiritual oferecido a toda a Igreja como
preparação para a grande celebração da Páscoa
da Ressurreição. 40 são os dias e noites de dilúvio, da destruição do pecado
e do restabelecimento da vida, da aliança com Deus (Gn 6-9); 40 são os anos de
peregrinação do Povo de Israel pelo deserto, numa marcha da escravidão à
liberdade, à verdadeira vida (Ex 15 – Dt 34); 40 são os dias de retiro de Jesus
no deserto, após seu batismo, onde enfrenta o demônio e nos mostra o caminho
para vencer toda tentação (Mt 4,1-11; Mc 1,12s; Lc 4,1-13).
A liturgia
das Cinzas é o resumo do que significa o período quaresmal:
1. A urgência da conversão: “É agora o momento
favorável, é agora o dia da salvação” (2Cor 6,2); a conversão é tarefa urgente,
é caminho que se deve trilhar a vida toda, sem desanimar nem perder a
esperança, pois é Deus que por ele nos conduz.
2. A disposição do coração: “Rasgai o
coração, e não as vestes; e voltai para o Senhor, vosso Deus; ele é benigno e
compassivo, paciente e cheio de misericórdia” (Jl 2,13); ninguém pode nem
precisa ter medo de Deus! Pelo contrário: quem se coloca na dinâmica da
conversão reconhece e vivencia que Deus está sempre disposto a perdoar, a
acolher o pecador e mostrar-lhe um caminho novo, pois é Ele mesmo o caminho da
vida em plenitude (Jo 10,10), Ele é amor (1Jo 4,8.16).
3. Os exercícios quaresmais: jejum, oração e
esmola (Mt 6,1-18). No coração do Sermão da Montanha, esse trecho nos
conduz para a compreensão de que a fé uma relação que nos desperta para a
inteireza, para uma dimensão totalizante da existência: no domínio das paixões
e dos vícios (jejum) reconheço a misericórdia de Deus (oração) que me faz atento
para as necessidades dos irmãos (esmola). Essa é a riqueza e a essência da vida
e da religião.
Também neste
tempo, a piedade popular nos ensina práticas muito propícias para alimentar e
efetivar em nós uma vida nova. Principalmente as mortificações, os pequenos sacrifícios que voluntariamente fazemos
durante a Quaresma (ficar sem beber, sem comer doce, sem comer carne, sem
fumar, etc.), nos ajudam a entender que sem renúncia não é possível ser livre
para amar verdadeiramente. A Via Sacra,
que devotamente celebramos nas sextas-feiras, nos ajuda a refletir sobre como anda
a nossa vida e, no caminho com Jesus, nos oferece a possiblidade de deixar para
trás tantos obstáculos que nos impedem de uma relação mais sincera e autêntica
conosco mesmos, com os irmãos e com o próprio Deus. Na contemplação do Senhor Crucificado vislumbramos o
mistério do amor misericordioso de Jesus, capaz de entregar-se totalmente por
nós, escancarando para nós o coração do Pai (Jo 15,13; 1Pd 2,21-25).
De um modo
todo especial, “a Quaresma deste Ano Jubilar seja vivida mais intensamente como
tempo forte para celebrar e experimentar a misericórdia de Deus” (MV 17),
sobretudo através da frequência ao Sacramento
da Reconciliação (ou Penitência
ou Confissão), ao mesmo tempo tribunal cuja sentença é a vivência de
autênticas relações de fraternidade e solidariedade, hospital para a cura das feridas mais profundas da alma e
restabelecimento da saúde eclesial, lar
em que se experiencia o amor misericordioso de Deus Pai, escola de justiça e conversão.
As cinzas (Gn 3,19; Jó 42,5s; Jn 3,5-10) e
o deserto (Ex 16,10; Ne 9,19; Os 2,16),
fortes imagens simbólicas deste tempo, nos convidam a percorrer um novo
caminho, de arrependimento e conversão, de tomada de nova decisão e novo
sentido na vida! É tempo de reacender a esperança! Com os instrumentos que a Santa
Igreja, em sua sabedoria, nos oferece, podemos percorrer sem medo nem tristeza
nosso itinerário quaresmal! Nosso rumo é certo: a vitória sobre a morte e o
pecado na Cruz-Ressurreição de Jesus!
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